terça-feira, 31 de março de 2009

MAIS COMIDA PARA O DRAGÃO



 








As montanhas de dinheiro que os governos em todo mundo estão disponibilizando para salvar principalmente bancos e montadoras, nada mais são do que alimento de dragão, um dragão insaciável. A ajuda aos bancos, apenas nos Estados Unidos, alcança US$ 1 trilhão, e a cúpula do G20 em Londres anuncia a cifra de US$ 5 tri para alimentar o dragão. O planeta não dispõe mais dos recursos necessários à manutenção do monstro. Um dos dois tem que morrer- o dragão ou o planeta.

 

por Robert Kurz

O que é a economia empresarial? O estudo acadêmico deste aspecto da economia capitalista afirma que se trata de algo tão antigo como a própria humanidade. Pois sempre houve "instalações de produção". Desde a antiguidade nos foram deixados livros onde se descreve como deve ser tratado um bem da economia agrária; seja a poda correta das árvores de fruto ou o tratamento adequado dos escravos. Mas a moderna economia empresarial já não trata da produção de bens. A finalidade das instalações produtivas pré-modernas era apenas o fabrico de bens de consumo e a respectiva "ciência" descreve como se faz. Com a moderna ciência econômica empresarial a finalidade é apenas a valorização do capital-dinheiro, enquanto a produção de bens de uso não passa de um meio subordinado a esta finalidade superior. Assim, a ciência econômica empresarial não descreve como fabricar mais adequadamente este ou aquele bem, mas como orientar da melhor maneira possível o curso da produção no seu conjunto, para a finalidade do aumento do dinheiro. 

Do ponto de vista clássico e também marxista trata-se do enriquecimento subjetivo, duma espécie de "querer-ter". A economia empresarial seria, portanto, o mecanismo funcional de uma relação de poder, com a qual certos homens retiram dinheiro de outros a fim de guardá-lo para si ("exploração"). Mas neste modo de ver mais uma vez é ignorada a diferença em relação às condições agrárias, pré-modernas, nas quais uma casta dominante efetivamente se apropriava do "sobreproduto" (Marx), para consumi-lo todo regaladamente. O que de modo nenhum é válido em relação à finalidade da economia de empresa. Nem os acionistas nem os gestores podem consumir o sobreproduto capitalista. Antes ele tem que regressar como mais valia à forma do dinheiro, para na sua maior parte ser reinvestido; e não ao sabor da conveniência subjetiva, mas de acordo com a "coação muda da concorrência" (Marx). Assim, a mais valia tem que ser utilizada sempre sem fim para obter nova mais valia (acumulação). O objetivo da economia empresarial é, portanto, uma auto-finalidade em si irracional: a produção pela produção, a acumulação de dinheiro pela acumulação de dinheiro. 

O conhecido autor de ficção científica Stanislaw Lem apresentou na forma de uma parábola esta absurda fixação no fim em si mesmo. No planeta Abrásia, "a economia da civilização local está toda ao serviço do dragão". O monstro devorador tem que ser alimentado pelos habitantes e cresce sem parar. O governo preserva e mantém o dragão, pois todos os rendimentos dos habitantes são obtidos no trabalho de alimentação do dragão e nada pode ser produzido que não esteja subordinado ao objetivo final de fazer crescer o dragão. De acordo com esta imagem, os capitalistas e gestores não seriam os sujeitos do enriquecimento pessoal, mas apenas "funcionários do serviço de alimentação do dragão", servidores desse serviço de fim em si mesmo ou fetichista. É nesse sentido que Marx lhes chama "fanáticos da valorização do valor". 

A economia empresarial revela-se assim como um mecanismo funcional para a produção de bens na forma de "comida para o dragão" da valorização do dinheiro. Reina aqui uma noção de eficiência que já nada tem a ver com as necessidades humanas. Eficiência significa que a força de trabalho seja "utilizada" com intensidade otimizada no seu tempo de produção. Um caso extremo é revelado pela jornalista Bárbara Ehrenreich dos Estados Unidos: Lá a ida ao banheiro já é considerada um "roubo de tempo"; em algumas empresas as trabalhadoras têm que usar fraldas (por exemplo, caixas de supermercado). 

"Eficiente" do ponto de vista econômico-empresarial é também lançar diretamente na natureza efluentes gasosos e líquidos e outros "excrementos da produção" (Marx). Lem diz que o dragão da Abrásia "com mau tempo cheira mal a mil quilômetros". A mesma lógica de eficiência está ligada com a razão porque frangos congelados ou embalagens de iogurte fazem milhares de quilômetros em busca de custos mais baixos das funções econômico-empresarialmente repartidas, o que do ponto de vista dos gastos naturais e materiais é duma ineficiência que brada aos céus. Deste conceito decorre também a poupança nos custos de segurança, o que leva a acidentes, destruição da paisagem, roubos e outros danos sociais. 

O economista americano William Kapp descreveu já em 1950 o absurdo do cálculo de custos econômico-empresariais, no seu livro Custos econômicos da economia privada. Kapp chama "custos sociais" ao conjunto de danos provocados pela redução de custos na economia empresarial. A sua síntese: "A moderna teoria dos preços parte da suposição tácita de que as despesas empresariais incluem a totalidade dos custos de produção. Se se integrar nessa teoria os custos sociais, impostos pela ordem vigente, fica claro que não passa de um mito a força pretensamente benfazeja desta ordem do processo de concorrência". 

Após as tímidas e sempre falhadas tentativas de ter em conta os "custos sociais" no cálculo econômico-empresarial, hoje, na crise, o dragão está mais devorador do que nunca. O objetivo da emancipação ecológica e social só pode ser a morte do dragão: a supressão da economia empresarial, para desenvolver um conceito de eficiência qualitativamente diferente, que considere todo o contexto do encadeamento das relações de reprodução social e não provoque mais "custos sociais".

 

Original alemão Futter für den Drachen em "Neues Deutschland", Berlim, 05.03.2004.

 

Tradução de Ana Moura

 

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