segunda-feira, 28 de julho de 2008

Hurlements en Faveur de Sade - 1952



[PUBLIC DOMAIN.] Em 1952 um situacionista amigo de Cornelius Castoriadis filma "Alaridos a favor de Sade". A película é em sua maior parte (pouco mais de uma hora) sem imagem (ou seja, com a tela negra) e sem som. Hurlements en faveur de Sade é considerado por alguns como a obra prima de Debord. Um filme inquietante que coloca na berlinda tanto artistas como espectadores.

"Após sairmos dessa bagunça e criarmos uma sociedade sadia, livre, as gerações futuras olharão para trás e verão Guy Debord como a personalidade do século XX que mais contribuiu para essa libertação". Ken Knabb em "http://www.geocities.com/projetoperiferia4/introbra.htm

quarta-feira, 2 de julho de 2008

A importância de negar-se o serviço militar

Leon Tolstoi


 

Existe um provérbio russo que diz: Podes desobedecer a teu pai e a tua mãe, mas obedecerás ao couro de um asno, ou seja, a um tambor. E este provérbio se aplica literalmente aos homens de nosso tempo que não tem aceito a doutrina de Cristo, ou que a aceitam deformada pela Igreja que essencialmente renega todo sentimento humano, homens que não obedecem outra coisa senão a um tambor. Apenas uma coisa os pode libertar do tambor: a profissão da verdadeira doutrina de Cristo.


 

Os povos europeus apreciam trabalhar por estabelecer novas formas de vida, elaboradas desde há muito tempo nas consciências, mas é sempre o velho despotismo grosseiro que lhes guia a vida. As novas concepções da vida não somente não se realizam, como até mesmo as antigas, aquelas que a consciência humana tem denunciado desde há tanto tempo -- por exemplo, a escravidão, a exploração de uns pelos outros em proveito do luxo e da ociosidade; os suplícios e as guerras -- se afirmam a cada dia de uma maneira cruel. A causa é que não existe uma definição do bem e do mal aceita por todos os homens, de maneira que qualquer que seja a forma de vida posta em prática, há de ser sustentada pela violência.


 

Ao homem pareceu simpático inventar uma forma superior de vida social, garantindo, ao seu parecer, a liberdade e a igualdade, mas não poderia livrar-se da violência, posto que ele mesmo é um violador.


 

Qual o efeito disso? Por grande que seja o despotismo dos governantes, por terríveis que sejam os males que este despotismo despeje sobre os homens, o homem ligado à vida social terá que ver-se sempre submetido a ele. Este homem, ou aplicará sua inteligência para justificar a violência existente e para encontrar o que é mau, ou se consolará pensando que logo encontrará o meio de derrubar o governo e de estabelecer outro, tão bom, que transformará tudo o que agora é mau. E, enquanto espera que se realize esta mudança, rápida ou lenta, das formas existentes, mudança pela qual espera a salvação, obedecerá com servilismo aos governos que existem, sejam lá quais forem, e quaisquer que sejam suas exigências. Embora não aprove o poder que, em dado momento, emprega a violência, não apenas não nega a violência, nem os meios de empregá-la, como também a julga necessária. E, por esta causa sempre obedecerá à violência governamental existente. O homem social é um violador, e inevitavelmente há de ser também um escravo.


 

A submissão com a qual -- sobretudo os europeus que tão orgulhosos se mostram da liberdade -- tem aceito uma das medidas mais despóticas, mais afrontosas que jamais teriam podido inventar os tiranos, o serviço militar obrigatório, prova isso mais do que qualquer coisa. O serviço militar obrigatório, aceito sem contradição por todos os povos, sem revolucionar-se, e até com júbilo liberal, é uma prova resplandecente da impossibilidade para o homem social livrar-se da violência e modificar o estado de coisas existentes.


 

Que situação pode ser mais insensata, mais insensível do que a que se encontra agora os povos europeus que gastam a maior parte de seus recursos fazendo os preparativos necessários para destruir seus vizinhos, homens dos quais nada lhes separa e com os quais vivem na mais estreita comunhão espiritual? Que pode haver de mais terrível para eles que estar sempre esperando que um louco que se proclame imperador diga algo que possa ser desagradável a outro louco semelhante? Que pode haver de mais terrível que todos esses meios de destruição inventados a cada dia: canhões, bombas, granadas, metralhadoras, pólvora seca, torpedeiros e outros engenhos mortais? Sem embargo, todos os homens, como bestas empurradas pelo chicote em direção ao matadouro, irão com docilidade para onde quer que lhes enviem, perecerão sem sublevar-se e matarão outros homens sem mesmo perguntar-se porque o fazem, e não apenas não se arrependerão disso, como também se mostrarão orgulhosos dessas medalhas que é autorizado a carregar por haver matado bastante, e levantam monumentos ao louco desgraçado, ao criminoso que lhe obrigou a cometer tais atos.


 

Os homens da Europa liberal se regozijam de poder escrever toda classe de tolices e de divulgar o quanto se gasta nos banquetes, nos encontros, nas câmaras, e se crêem completamente livres, semelhante a bois que pastam no pasto do açougueiro acreditando ser completamente livres. Sem embargo, talvez nunca o despotismo do poder tenha causado tantas desgraças aos homens como agora, nem lhes tenha depreciado tanto como hoje. Jamais o descaro dos violadores e a covardia de suas vítimas alcançou o grau que contemplamos.


 

Quando os jovens se apresentam nos quartéis, são acompanhados pelos pais e mães, e se comprometem matar até mesmo eles. É evidente que não há humilhação nem vergonha que não suportem os homens da atualidade. Não há covardia nem crime que não cometam, desde que isso lhes cause o menor prazer e lhes livre do perigo mais insignificante. Nunca a violência do poder e a depravação dos dominados chegou a tal extremo. Sempre houve e há entre os homens possuídos de força moral algo que considerem sagrado, algo que não cedem por preço algum, algo pelo qual estão prontos a suportar privações, sofrimentos, até mesmo a morte; algo que não trocariam por nenhum bem material. E quase cada homem, por pouco desenvolvido que seja, o possui. Ordene a um camponês russo que cuspa na óstia ou blasfeme o altar e ele morrerá antes de fazê-lo. Estão enganados, crêem que as imagens são sagradas e não consideram o que verdadeiramente é sagrado (a vida humana), consideram a lei uma coisa sagrada que não desobedecem por nada. Mas há um limite à submissão, há nele um osso que não se dobra. Mas onde está este osso não civilizado que não se venda como escravo ao governo? Qual será esse algo sagrado que nunca abandonará?


 

Não existe; é completamente frouxo e se dobra por inteiro. Se existisse para ele algo sagrado, então, levando em conta tudo o que há nessa patética sociedade hipócrita em que vive, esse algo deveria ser a humanidade, ou seja, o respeito ao homem em seus direitos, à sua liberdade, à sua vida. O que significa isso?


 

Ele, o sábio instruído que nas escolas superiores tem aprendido tudo o que a inteligência humana elaborou antes dele, ele que se coloca acima da multidão, ele que continuamente fala da liberdade, dos direitos, da intangibilidade da vida humana, é eleito, é revestido de um traje grotesco, e ordena levantar-se, saudar, humilhar-se, ante todos os que tem um grau a mais no uniforme, ordena prometer que matará seus irmãos e seus pais, e estar pronto a fazer todas estas coisas. A única pergunta que faz é quando e como deverá passar estas ordens. No outro dia, uma vez livre desses encargos, voltará novamente e com mais afinco a prédica dos direitos, da liberdade, da intangibilidade da vida humana, etc., etc.


 

Exatamente isso! É com tais homens que prometem matar a seus pais, que os liberais, que os socialistas, que os anarquistas, que os homens sociais em geral pensam organizar uma sociedade onde o homem seja livre! Mas que sociedade moral e razoável pode-se edificar com semelhantes homens? Com semelhantes homens, qualquer combinação que se faça não pode resultar mais que um rebalho de animais dirigidos aos gritos pelos chicotes dos pastores.


 

Este é um fardo pesado sobre os ombros dos homens, um fardo que os oprime, e os homens cada vez mais oprimidos buscam uma maneira de livrar-se dele.


 

Sabem que unindo suas forças poderiam retirar o fardo e lançá-lo fora, mas não conseguem chegar a um acordo sobre a maneira de fazê-lo, enquanto isso cada qual se inclina cada vez mais, deixando que o fardo se apóie sobre os ombros dos outros. E o fardo lhes esmaga mais e mais, e todos já teriam perecido se não houvesse quem lhes guiasse em alguns atos, não pelas considerações das conseqüências exteriores dos atos, mas sim pelo acordo do rito com a consciência.


 

Esses homens são os cristãos; em vez do fim exterior cujo logro exige o consentimento de todos, se consagram a um fim interior acessível sem que nenhum consentimento seja necessário. Nisso está a essência do cristianismo. Por isso, a salvação do servilismo em que se encontram os homens, impossível aos homens de idéias socialistas, tem-se realizado pelo cristianismo; a concepção real da vida deve ser suprida pela concepção cristã da vida.


 

O fim geral da vida não pode ser inteiramente conhecido -- diz a doutrina cristã a cada um -- e se apresenta diante de ti unicamente como a aproximação cada vez maior, de todos, de um bem infinito; a realização do reino de Deus, na medida em que tu conheces indubitavelmente o objetivo da vida pessoal que consiste em realizar em ti a perfeição maior, o amor necessário para a realização do reino de Deus. Este fim, tu conhecerás sempre, e é sempre factível.


 

Tu podes ignorar os melhores fins particulares exteriores; podem surgir obstáculos entre eles e tu; mas ninguém nem nada pode deter a aproximação em direção ao aperfeiçoamento interior e o aumento do amor em ti e nos outros. Basta ao homem substituir o objetivo exterior, social, embusteiro, pelo único fim verdadeiro, indiscutível, acessível, interior da vida, para em seguida ver cair todas as cadeias que pareciam impossíveis de romper, e se sentirá completamente livre.


 

O cristão rechaça a lei do Estado porque não tem necessidade dela nem para ele nem para os demais, posto que julga a vida humana mais garantida pela lei do amor que professa, que pela lei sustentada pela violência.


 

Para o cristão que conhece as necessidades da lei do amor, as necessidades da lei da violência não somente não podem ser-lhe obrigatórias, como se apresentam diante dele como erros que devem ser denunciados e destruídos.


 

A essência do cristianismo é o cumprimento da vontade de Deus que não pode ser possível pela atividade exterior que consiste em estabelecer e aplicar formas exteriores de vida, a vontade de Deus é apenas possível pela atividade interior, pela mudança da consciência, e consequente melhora da vida humana. A liberdade é a condição necessária da vida cristã. A profissão do cristianismo livra o homem de todo poder exterior, e ao mesmo tempo lhe dá a possibilidade de esperar o melhoramento da vida que busca em vão pela mudança das formas exteriores da vida.


 

Os homens acham que sua situação melhora graças às mudanças das formas exteriores da vida, e, sem embargo essas mudanças nem sempre resultam em uma modificação da consciência.


 

Todas as mudanças exteriores das formas que não são conseqüência de uma modificação da consciência, não somente não melhoram a condição dos homens, como com freqüência a agravam. Não são os decretos do governo que tem abolido a matança de crianças, as torturas, a escravidão, é a evolução da consciência humana que tem provocado a necessidade destes decretos; e a vida não melhora em passo mais rápido do que o passo do movimento da consciência, ou seja, a vida melhora na medida em que a lei do amor ocupa na consciência do homem o lugar antes ocupado pela lei da violência.


 

Se as modificações da consciência exercem um influxo sobre as modificações das formas exteriores da vida, isso faz parecer aos homens que a recíproca seria verdadeira, e como é mais agradável e mais fácil (os resultados da atividade são visíveis) dirigir a atividade sobre as mudanças exteriores, preferem sempre empregar suas forças não em modificar sua consciência e sim em mudar as formas de vida, e por esta causa, na maioria dos casos, se ocupam não da essência do assunto mas de sua forma. A atividade exterior inútil, mutável, que consiste em estabelecer e aplicar formas exteriores de vida, oculta aos homens a atividade interior, essencial na mudança de sua consciência, que é a única que pode melhorar sua vida. E este erro é o que retarda cada vez mais a melhora geral da vida dos homens.


 

Una vida melhor não pode lograr-se sem o progresso da consciência humana, e por isso, todo homem que deseja melhorar a vida, deve dedicar-se a melhorar sua consciência e a dos demais. Mas isso é precisamente o que os homens não querem fazer, ao contrário, empregam todas suas forças em mudar as formas de vida esperando que reportarão uma modificação de consciência.


 

O cristianismo, e unicamente o cristianismo, livra os homens da escravidão em que se encontram na atualidade, e apenas o cristianismo lhes dá a possibilidade de melhorar realmente sua vida pessoal e a vida geral. Isto deveria ser claro para todos; mas os homens não podem aceitar isso enquanto a vida, segundo as concepções sociológicas, não for completamente conhecida, tanto no terreno dos costumes, como no terreno das crueldades, e enquanto os sofrimentos da vida social e governamental não forem estudados em todos os sentidos.


 

Com freqüência é citado como a prova mais convincente da insuficiência da doutrina de Cristo, o fato desta doutrina conhecida há dezenove séculos ainda não ter sido aceita e admitida além de seu formato exterior. Essa doutrina é conhecida há muito tempo e ainda não é um guia para a vida dos homens. Muitos mártires do cristianismo sofreram em vão sem mudar a ordem existente e isso é uma clara prova de que tal doutrina não é verdadeira nem factível. É o que dizem os homens.


 

Falar e pensar assim é o mesmo que dizer e pensar que um grão que não dá imediatamente flores e frutos, e que se desloca na terra, é mau e estéril.


 

O fato da doutrina de Cristo não ser aceita em toda sua importância desde o momento em que apareceu, e não ser admitida além de uma forma exterior, alterada, era inevitável e necessário.


 

Uma doutrina que destruiu toda a antiga concepção do mundo e estabeleceu uma nova, não podia ser aceita de imediato em toda sua importância, não podia ser aceita além de seu aspecto exterior e disforme. E, ao mesmo tempo, sua aceitação sob esta forma, foi para que os homens, incapazes de compreender a doutrina e a via moral, fossem guiados pela mesma via a aceitá-la em toda sua verdade.


 

Podemos imaginar os romanos e os bárbaros aceitando a doutrina de Cristo no sentido que agora compreendemos? Será que os romanos e os bárbaros poderiam crer que a violência levava ao aumento da violência, e que as torturas, os suplícios, as guerras não explicam e não resolvem nada, mas que embrulham e complicam tudo?


 

A grande maioria dos homens daquele tempo não era apta a compreender a doutrina de Cristo pela via moral. Era necessário guiar-lhes pela mesma via, pelos meios que mostravam na prática, que cada cisão da doutrina entranhava um mal.


 

A verdade cristã em outra época, mais elevada pelo espírito do sentimento profético, se converteu em verdade acessível até mesmo para o homem de espírito mais simples, e em nossos dias, esta verdade se revela a cada um.


 

A evolução da consciência não se faz por saltos, não é descontínua e nunca se pode encontrar os limites que separam os períodos da vida da humanidade; e sem embargo, existem, como existem entre a infância e a adolescência, entre o inverno e a primavera, etc.. Se não há uma risca limítrofe, há um período transitório, e é o que agora atravessa a humanidade européia. Tudo está preparado para a passagem de um período ao outro, não falta mais que um impulso que realize esta mudança. E este impulso pode dar-se a cada momento. A consciência social nega desde há muito as formas antigas da vida, e está pronta a adotar as novas. Todos sabem dela e igualmente a sentem. Mas a inércia do passado, o temor do porvir fazem com freqüência que o que está preparado há muito tempo na consciência de todos não torne-se ainda uma realidade, às vezes basta uma palavra para que a consciência se imponha, e esta força importante na vida comum da humanidade -- opinião pública -- transforma imediatamente, sem luta e sem violência, toda a ordem existente.


 

A situação da humanidade européia com o funcionalismo, os impostos, o clero, as prisões, as guilhotinas, as fortalezas, os canhões, a dinamite, parece, com efeito, horrível, mas apenas parece. Tudo isso, todos os horrores que se cometeram, não se baseiam mais do que em nossa representação. Todas essas coisas, não apenas não deveriam existir, como também deveriam deixar de existir diante do estado da consciência humana. A força não está nas prisões, nos grilhões, nos canhões, na pólvora, a força está na consciência dos homens que aprisionam, constroem, manejam os canhões. E a consciência desses homens está em luta com a contradição mais manifesta, com a contradição mais temível, e se vê atraída por pólos opostos. Cristo disse que venceu o mundo, e ele o venceu de fato.


 

O mal deste mundo, apesar de todos seus horrores não mais existe, porque tem desaparecido da consciência dos homens. E não precisa mais que um pequeno impulso para que se destrua o mal, e este dê lugar a uma nova forma de vida.


 

Nos primeiros tempos do cristianismo, o guerreiro Teodoro foi executado por declarar ao seu comando que por ser cristão não poderia portar armas, seus condenadores o olharam estupefatos, considerando-o louco, e não apenas não ocultaram tal ato, como também o expuseram à reprovação geral.


 

Mas hoje quando na Áustria, na Prússia, na Suécia, na Rússia, e em toda Europa, o número de refratários cresce de uma maneira considerável, esses casos não parecem mais aos potentados como casos de loucura; mas como atos bem perigosos, e os governos não mais não os lançam à execração geral, mas os ocultam com cuidado, sabedores que os homens se livram de sua escravidão, de sua ignorância, não pelas revoluções, pelas associações operárias, pelos congressos da paz, pelos livros, e sim pelo modo mais simples, isto é; que cada candidato a tomar parte na violência contra seus irmãos e contra si mesmo pergunte com assombro: Por quê hei de fazê-lo?


 

Não são as complicadas instituições, as associações, os julgamentos, etc., que salvarão a humanidade, será o simples arrazoamento, quando se tornar geral. E pode e deve sê-lo logo. A situação dos homens de nossa época é semelhante a do homem atormentado por um horrível pesadelo; o homem vê a si mesmo em uma situação extraordinária, diante de um mal horrível que avança sobre ele; compreende que aquilo não pode acontecer, mas não consegue deter o mal que se aproxima cada vez mais, é tomado pelo desespero, e já no limite faz uma pergunta a si mesmo: mas é isso verdade? E basta que duvide da verdade do mal para que em seguida desperte e se dissipe toda a angústia que sofria.


 

O mesmo ocorre com este estigma da violência, da servidão, da crueldade, da necessidade de participar desta terrível contradição, entre a consciência cristã e a vida bárbara na qual se encontram os povos europeus. Mas quando despertarem do sonho em que estão mergulhados, quando despertarem para a contemplação superior da vida revelada pelo cristianismo há mil e novecentos anos, quando esta chama queimar por toda parte, repentinamente desaparecerá tudo aquilo que é tão terrível, como ocorre ao despertar-se de um pesadelo, a alma, a consciência daquele que sofre esse pesadelo se fartará de satisfação, e até mesmo lhe será difícil compreender como semelhante insensatez pôde vir-lhe em um sonho.


 

Bastará despertar um instante desse aturdimento perpétuo no qual o governo trata de nos manter, bastará contemplar o que fazemos sob o ponto de vista das exigências morais, bastará contemplar o que pedimos às crianças, e o que fazemos aos animais, para horrorizá-los de toda a evidência da contradição em que vivemos. É necessário apenas que o homem desperte do estado hipnótico em que vive, que mire sobriamente o que o Estado exige dele para que, não apenas negue obediência, mas sinta uma perplexidade e uma indignação indizível do atrevimento de virem até você com semelhantes exigências.


 

E este despertar pode produzir-se de um momento para outro.