quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Capitalismo em crise, mais uma vez!


Por anarchist writers

Qual a origem da contínua crise nas bolsas? Até que ponto a ideologia econômica contribuiu para isto? A socialização dos custos e riscos e a privatização dos lucros sempre foi a base do sistema capitalista?

Com a crise explodindo no mercado financeiro fica difícil fazer qualquer comentário pertinente e não redundante. Suas raízes estão na natureza do capital financeiro, que tende a gerar bolhas quando seus recursos são dirigidos a mercados específicos na tentativa de ganhar dinheiro. Antes da bolha imobiliária, houve a da dot.com. Antes da dot.com houve a do fiasco das Poupanças & Empréstimos...

A criação de tais bolhas é tão regular quando a negação que elas existem. Na busca por lucros, os bancos criam crédito e as instituições financeiras especulam. As margens de erro diminuem com o acúmulo de capital, enquanto a crescente desigualdade faz a demanda agregada chegar ao extremo. O crescente endividamento descamba na inadimplência, os novos compradores não conseguem entrar no mercado e o todo entra em colapso. A exuberância irracional vira medo e pânico, o crédito fácil fica caro e raro. O capital financeiro impacta a economia real, a indústria perde a alavancagem e o consumo diminui. Os investimentos já não compensam, empresas quebram (“Credit Crunch: The return of depression?”).

Então o corte de salário e crédito começa no bolso daqueles que não causaram a crise mas que são obrigados a pagar por ela. Como sempre.

Enquanto isso os defensores do status quo rangem os dentes e prometem restabelecer o mercado financeiro enquanto se queixam dos abusivos salários dos CEOs. [...] O regime republicano de Bush decidiu que o melhor caminho para ganhar votos é apresentar uma crítica semi-socialista ao capital financeiro! Assim, o regime de Bush implementa uma linha de crédito semi-socialista (quer dizer, “socialista” no sentido capitalista habitual de “ajuda estatal para o rico, e disciplina de mercado para os trabalhadores”).

Nos Estados Unidos, os políticos republicanos (engasgados na própria retórica) resistem a essa alavancagem. A busca por formas menos óbvias de intervenção estatal pelo capital se tornou agora um impedimento quando o governo precisa agir. Os democratas estão fazendo tudo que podem para esconder o caráter pró-capital do pacote, com mais apoio de “Main Street” do que de Wall Street. Ainda, eles estão atuando dentro de uma administração cuja retórica favorável aos “mercados livres” privilegia apenas os grandes negócios. Qualquer alavancagem será costurada para poucos, não para muitos.  

Um modelo condenado ao fracasso

A crise atual tem raízes profundas. Algumas estão na dinâmica inerente ao capitalismo, outras no formato particular do capitalismo atual (neoliberalismo). O fluxo de justificações ideológicas favoráveis ao neoliberalismo permitiu o aumento da influência da noção de mercados financeiros desregulamentados, que pode ser encontrada na análise neoclássica do mercado financeiro.

De acordo com a Hipótese do Mercado Eficiente, a informação é disseminada igualmente entre todos os participantes do mercado, todos compartilham interpretações semelhantes da informação e todos podem ter acesso a todo o crédito de que necessitam em qualquer momento e na mesma taxa. Em outras palavras, todos são considerados iguais em termos de acesso a informação, do que podem adquirir e do que eles fazem com tal conhecimento e dinheiro vivo. Isto resulta em uma teoria que defende bolsas negociando ações cujos preços são baseados numa futura remuneração desconhecida, ou seja, expectativas idênticas por investidores idênticos. Em outras palavras, investidores podem predizer o futuro corretamente e agir da mesma maneira diante da mesma informação. Mesmo que todos tivessem opiniões idênticas, ninguém compra nem vende ações com base em insinuações sobre desempenho. Semelhantemente, "investidor real" significa "crédito racionado", a taxa de empréstimo tende a subir se a quantia pedida aumenta e a taxa de empréstimo regularmente excede a taxa principal. O fomentador da teoria foi suficientemente honesto ao declarar que “a consequencia de acomodar tais aspectos da realidade será desastroso em termos de resultados úteis da teoria [...]. A teoria está dentro de um matadouro.” (W.F Sharpe, citado por Keen, Debunking Economics, p. 233)

Assim, para prover essa teoria, o mundo tornou-se um único barco a vela soprado pelo "eficiente" vento das bolsas (ou seja, em direção a uma acurada remuneração futura desconhecida). Apesar destes problemas, a teoria foi aceita pela corrente principal como uma bússola precisa para os mercados financeiros. Por quê? Bem, as implicações desta teoria são profundamente políticas na medida em que sugere que mercados financeiros nunca experimentarão nervosismo e quedas consideráveis. O fato disto ser contradito pela bem conhecida história das bolsas foi considerado sem importância. Previsivelmente, “com o passar do tempo, cada vez mais os dados se revelaram inconsistentes” com a teoria. Isto é porque o mundo do modelo “evidentemente não é nosso mundo”. A teoria “não pode ser aplicada em um mundo de investidores divergindo em suas expectativas, futuro incerto e alavancagem racionada”. Aquilo que “nunca deveria ter qualquer credibilidade se tornou um artigo de fé para acadêmicos em finanças, e uma convicção comum no mundo comercial de finanças.” (Keen, Op. Cit., p. 246 and p. 234)

Esta teoria está na raiz do argumento de que o mercado financeiro deveria ser desregulamentado de forma que qualquer fundo possa investir nele. Enquanto a teoria pode beneficiar uma minoria de grandes proprietários com poder de pressão na política do governo, é duro ver como beneficiaria o restante da sociedade. Alternativamente, teorias mais realísticas revelam as instabilidades endógenas nas bolsas, resultantes de investimentos ruins e da ausência de investimentos onde não se prevê uma taxa suficientemente alta de retorno. Coisas que exercem um impacto grande e negativo na economia real. Indo na direção contrária, a maior parte dos economistas adotou uma teoria econômica altamente irreal que encorajou o mundo a viciar-se na especulação da bolsa como se ela fosse imune a bolhas, euforias ou estouros (a euforia das bolsas nos anos 90 acabou estourando ao contrário do que muitos previram). Quais as consequências desta teoria econômica e de sua ridícula análise das bolsas? Dois economistas de renome já se manifestaram:

“Rejeitar a Hipótese do Mercado Eficiente para todo o mercado de valores [...] insinua decisões de produção amplamente baseadas em preços acionários que conduzirá a uma ineficiente alocação de capital. Em termos gerais, se a aplicação da teoria da expectativa racional nas condições virtualmente 'idealizadas' das bolsas falha, que confiança pode ter os economistas em sua aplicação nas demais áreas da economia [...]?” (Marsh and Merton, citado por Doug Henwood, Wall Street, p. 161)

Infelizmente (para a ideologia) a realidade tem o péssimo hábito de contestá-la. Isto pode ser visto hoje. A “eficiente” desregulamentação do mercado financeiro provou que os dogmas neoclássicos que justificaram e racionalizaram os atos e desejos do capital financeiro são tão ou mais irreais e enganosos quanto seus críticos afirmaram. Não poderia ser diferente, indiferentes à fissura no modelo teórico, nenhum dos chamados “especialistas” (incluindo os do governo) previu o estouro da crise embora os sinais da bolha imobiliária existissem há muitos e muitos anos. Os mesmos "peritos” que falharam em ver o problema agora propõem alavancar Wall Street! Mas, essa é a vocação deles -- sustentar a elite.

Isso não equivale dizer que foi a teoria econômica ruim que causou toda essa crise. Não, mas seu posicionamento ideológico fez com que o desejo de desregulamentação do capital financeiro parecesse objetivo e economicamente sensato. Essa é a mágica do mercado, uma teoria econômica que justifique o desejo financeiro e lhe forneça uma provisão adequada.

Privatizando lucros, socializando custos e risco.

 

Com o mercado financeiro em pânico, aumentam os apelos por alavancamento. O choque da crise está sendo usada para justificar alavancamento aos principais responsáveis pelo problema, com o estado garantindo que nenhum bilionário ou banqueiro fique desamparado. Isto configura um dos pontos fundamentais do capitalismo: privilégios e lucros (para poucos) em virtude de uma “tomada de risco”. Em vez do apoio ao explorado privilegia-se a renda do capital. Aplicar capital é “arriscado”, por isso quem o possui merece uma recompensa. 

 

Primeiramente, devemos lembrar que no popular modelo neoclássico, risco e incerteza não exercem nenhum papel na geração de lucros. De acordo com teoria do equilíbrio geral, se não há incerteza (o presente e futuro são conhecidos) não há lugar para risco. Assim, o conceito de lucro ligado a risco embora seja mais realístico que o modelo padrão é irreal de muitos outros modos, particularmente em relação ao presente capitalismo corporativo. 

 

De acordo com o mito capitalista, quem arrisca deve pagar o ônus. Mas o que acontece é que quando a vaca vai para o brejo o risco é socializado. Isto porque, dizem, a quebradeira bancária acabaria prejudicando a todos indistintamente. Estranhamente, durante os bons tempos os impactos da desigualdade são completamente ignorados. Enquanto poucos se beneficiam muitos são prejudicados, enquanto poucos ficam em situação difícil, muitos tem que pagar por eles. Essa “socialização do risco”, na verdade, sempre foi um dos pilares do capitalismo. Não se trata de um evento raro que ocorre nos tempos das vacas magras. A maioria desses “riscos” no interior do capitalismo não contribui para a produção e, graças à ajuda do estado, não existe para o capitalista. 


Assim, dizer que o “risco” justifica o capitalismo soa um pouco irônico diante do tipo dominante de organização  – a corporação. Estas empresas, baseadas na “responsabilidade limitada”, foram projetadas explicitamente para reduzir o risco enfrentado pelos investidores. Como nota Joel Bakan, antes disto “não importa quanto, ou quão pouco uma pessoa tinha investido em uma companhia, ela era pessoalmente responsável, sem limite, pelas dívidas da companhia. As casas, poupanças e avalistas dos investidores serviam de garantia aos credores caso a companhia quebrasse, possuir ações de uma companhia era extremamente arriscado. O mercado de capitais, portanto, não era uma opção verdadeiramente atraente [...] a não ser que esse risco fosse afastado, e foi o que aconteceu. Em meados do século XIX, líderes empresariais e políticos defenderam amplamente a mudança da lei no sentido de limitar a responsabilidade do acionista à quantia que ele investia numa companhia. Se uma pessoa comprasse R$100,00 em ações, na pior das hipóteses, ela teria seu dinheiro de volta, indiferente do que acontecesse à companhia”. A limitação da responsabilidade tinha o “exclusivo propósito de [...] isentar o acionista diante do desempenho das corporações” como também reduzir os riscos do investimento (distinto dos pequenos negócios). (The Corporation, pág. 11 e pág. 79) 

 

Isto significa dizer que os proprietários da ação (investidores) não teriam qualquer responsabilidade para com as dívidas e obrigações da corporação. Ou seja, o Estado cobriria potenciais perdas desde que elas não excedessem o que originalmente pagaram pelas ações. A justificativa disso é que o credor não participando das negociações teria sua responsabilidade limitada. Isto significa que a responsabilidade limitada permite aos donos das corporações alavancar empreendimentos reduzindo riscos e custos que são transferidos para os ombros dos demais setores da sociedade (sejam externalizados). Com efeito, o Estado concede às corporações o privilégio de operar com uma margem limitada de perdas, mas com uma margem ilimitada de lucros. 

 

Temos aqui claramente dois pesos e duas medidas, pois sugere que as corporações, na realidade, não são possuídas por acionistas, uma vez que estes não assumem qualquer responsabilidade sobre a propriedade, especialmente a responsabilidade de pagar dívidas. Ora, se não arcam com o prejuízo durante o período das vacas magras, por que usufruiriam do lucro no tempo das vacas gordas? As corporações são entidades ligadas ao governo, criadas em benefício de acionistas socialmente privilegiados pela limitação de sua responsabilidade financeira. Se suas dívidas são (no final das contas) públicas por que seus lucros deveriam ser privados? 


Desnecessário dizer, essa redução de risco não se limita ao interior do estado, é também internacionalmente aplicada. Grandes bancos e corporações emprestam dinheiro a nações em desenvolvimento, mas para “empresários que pedem emprestado o dinheiro [ou seja, a elite local] que não assumem qualquer responsabilidade por isso. É o povo [...]. quem tem que pagar [as dívidas]. Os emprestadores são protegidos de risco. Essa é uma das principais funções do FMI, prover um seguro livre de risco a uma elite que empresta e investe em empreendimentos arriscados. Eles ganham altos rendimentos porque há muito risco, mas eles não estão sujeitos a risco algum porque este é socializado. É transferido de vários modos aos contribuintes  e por outros dispositivos [...] O sistema inteiro funciona de forma que os emprestadores são liberados da responsabilidade. Ela é transferida para a massa empobrecida da população de seus próprios países. Os emprestadores ficam imunes ao risco.” (Noam Chomsky, Propaganda and the Public Mind, pág. 125) 

 

O Capitalismo, bem ironicamente, desenvolveu a externalização com o intuito de lançar o ônus sobre outros setores  -- provedores, credores, trabalhadores e (no final das contas) na sociedade como um todo. “Socializar custos e riscos” significa “privatizar lucro”. (Noam Chomsky, Op. Cit., pág. 185). Querer  justificar lucros corporativos em termos do risco que correm soa a mais extrema hipocrisia, particularmente diante do exemplo de pequenos empresários que normalmente acabam arcando com os fardos oriundos da externalização que canaliza o risco para seus ombros! Doug Henwood declara o óbvio quando escreve que para o acionista “as responsabilidades estão por definição limitadas ao que eles pagaram pelas ações” e “eles sempre podem vendê-las a uma empresa em dificuldades, e se eles diversificarem carteiras, eles podem controlar um ocasional trauma com relativa facilidade. Empregados, e freqüentemente clientes e prestadores de serviço, raramente têm essa imunidade”. Dado que os “sinais emitidos pelo mercado de valores são irrelevantes ou prejudiciais à real atividade econômica, e que o próprio mercado de valores exerce pouco ou nenhum papel como fonte de finanças” o argumento do risco como uma defesa para seus lucros é extremamente fraco. (Wall Street, pág. 293 e pág. 292) 


Do ponto de vista do capital, “risco” significa investir dinheiro no mercado de valores comprando ações. Contudo, esse “risco”  está longe de contribuir para a produção. Como David Schweickart mostra, “na vasta maioria dos casos, quando você compra papéis, você dá seu dinheiro não para a companhia, mas para outra pessoa física. Você compra seu lote de ações de alguém que troca a ação dele. Nem um níquel de seu dinheiro vai para a própria companhia. O lucro da companhia teria sido exatamente o mesmo, com ou sem sua compra acionária.” (After Capitalism,, pág. 37). Na realidade, entre 1952 e 1997, aproximadamente 92% do investimento era liquidado para pelo próprio fundo interno das empresas, de forma que “o mercado de valores não contribui virtualmente em nada para o financiamento do investimento externo”. Até mesmo novas ofertas acionárias respondiam apenas por 4% das despesas de capital das corporações não financeiras. (Henwood, Op. Cit., pág. 72). “Apesar do grande valor simbólico do mercado de valores, é notório que tem relativamente pouco a ver com a produção de bens e serviços”, assinala David Ellerman. Grande parte das transações acionárias está mais relacionada à especulação do que a empreendimentos produtivos. (The Democratic worker-owned firm, pág. 199) 

 

Em outras palavras, a maioria dos investimentos não passa do “risco” associado com a compra de papeis potencialmente rentáveis em um mundo incerto. A ação do comprador não contribui de forma alguma para produzir aquela renda potencial que só pode resultar da labuta de outros. Na melhor das hipóteses, poderia ser dito que um dono prévio das ações em algum momento no passado “contribuiu” para a produção provendo dinheiro, mas isto não justifica uma renda oriunda do não trabalho. Investir em ações pode reorganizar a riqueza existente (freqüentemente com grande vantagem para o reorganizador), mas nunca produz coisa alguma. A nova riqueza flui da produção, o uso do trabalho na riqueza existente gera nova riqueza. 

 

Ironicamente, o mercado de valores (e o risco nele baseado) lesa este processo. A noção de que dividendos representa o retorno devido ao “risco” pode ser desmentida olhando como os mercados operam na realidade, em vez de teoricamente. Mercados de valores reagem a recentes movimentos no preço de mercados de valores, causando oscilações nos preços para construir oscilações nos preços. De acordo com o economista e financista Professor Bob Haugen, isso ocorre pelo fato dos mercados financeiros serem dotados de uma instabilidade endógena. Essa volatilidade induzida nos preços representa três-quartos de toda a volatilidade no mercado financeiro. Isto significa dizer que o mercado conduz os investimentos de uma forma atabalhoada na medida em que alguns investimentos são desperdiçados em companhias sobrevalorizadas e em empresas subvalorizadas que não conseguem angariar finanças para produzir bens úteis. A endógena volatilidade dos mercados reduz o nível global de investimento na medida em que os investidores alavancam apenas projetos que devolvem um nível suficientemente alto de retorno. Isto resulta em um sério entrave ao crescimento econômico. Portanto, o tal “risco” tem um grande e negativo impacto na economia real e parece irônico recompensar tal comportamento. Especialmente quando a alta taxa de retorno tem o propósito de compensar o risco de investir no mercado de valores, mas na realidade a maioria deste risco é o resultado da estabilidade endógena do próprio mercado. (Steve Keen, Debunking Economics, pp. 249-50) 


Em vez de avaliações individuais determinando “riscos”, temos avaliações subordinadas à posição de classe dos indivíduos envolvidos. Como destaca Schweickart, “grande número de pessoas simplesmente não têm nenhum dinheiro sobrando para investir. Eles não podem jogar nada [...] e entre os que podem jogar, alguns são melhor situados que outros. Riqueza dá acesso a informação, a conselho de especialista, e a oportunidades de diversificação que frequentemente falta ao pequeno investidor ”. (After Capitalism, pág. 34). Dessa forma, lucros não refletem o real custo do risco, mas a escassez de gente com qualquer coisa para arriscar (ou seja, desigualdade de riqueza). 

 

Semelhantemente, dado que os capitalistas (ou os gerentes contratados que eles contratam) têm um monopólio de decisão que cria poder dentro de uma empresa, qualquer risco feito por uma companhia reflete aquela hierarquia. Assim, risco e habilidade para criar riscos são monopolizados em umas poucas mãos. Se lucro é então produto de risco então, em última análise, é o produto de uma companhia hierarquicamente estruturada e, consequentemente, os capitalistas estão se recompensando simplesmente porque eles têm poder dentro do local de trabalho. Em outras palavras, porque os gerentes monopolizam a decisão que criam (“risco”) eles também monopolizam o valor de excesso produzido pelos trabalhadores. Porém, o anterior de nenhuma maneira justifica esta apropriação nem a cria. 

 

Assim como a produção coletiva é inerente ao capitalismo, assim também deve ser o risco. Como Prodhon destacou, pode-se argumentar que o capitalista “corra sozinho o risco do empreendimento”, mas isto não significa que o capitalista “atue apenas em uma mina ou via férrea” nem “apenas em uma fábrica, veleje apenas em um navio, aplique apenas em uma tragédia, construa apenas um Panteão”. Ele pergunta: “Qualquer um pode fazer tais coisas, mesmo que tenha o capital necessário?” Assim “a associação” se torna “absolutamente necessária e certa” assim como o “trabalho a ser realizado” é “a propriedade comum e não dividida de todos esses que levam sua parte”. Se não fosse assim, os acionistas “saqueariam os corpos e as almas dos trabalhadores assalariados” e seria “uma afronta a dignidade humana e a personalidade” (A Idéia Geral da Revolução, pág. 219). Como a produção é coletiva, assim é o risco enfrentado e, por conseguinte, risco não pode ser usado para justificar impedir pessoas de controlar o funcionamento de suas próprias vidas ou o fruta do seu trabalho. 

 

É desnecessário dizer que as conseqüências mais sérias do “risco” normalmente são sofridas pelos trabalhadores que podem perder seus empregos, saúde e até mesmo vive tudo dependendo em como o risco o atinge em um mundo incerto. Jogar sua própria renda em uma decisão arriscada é uma coisa, mas arruinar as vidas dos outros com sua decisão é outra coisa completamente diferente. Com o pânico nos mercados financeiros, chegou o momento ideal por os anarquistas discutirem essa corrida econômica cuja base é permitir poucos no controle, empreendimento arriscado e lucro extraído do trabalho de muitos não só é imoral, não funciona. 

 

Precisamos de uma sociedade cuja base não seja subornar o rico assegurando-lhe investimento e desenvolvimento econômico. Precisamos (como discutiram muito tempo os anarquistas) de uma economia onde os próprios trabalhadores controlem a gestão e a produção. A menos que nos convençamos de que o capitalismo precisa ter um fim, qualquer solução para os pânicos atuais será bancada pela classe trabalhadora e a elite vai, como sempre, beneficiar-se dos sacrifícios de muitos. 

 

Que fazer agora? 

 

Naturalmente, são poucos os que acreditam que a crise financeira se instalou por causa da grande (em vez de pequena) interferência estatal. O estopim desta crise foi aceso pelos mais de trinta anos de desregramento financeiro. Agora, a  classe capitalista que defendia esse desregramento vem  vergonhosamente pedir socorro à ação estatal , proclamando a necessidade de liquidação para criar um maravilhoso e “puro” sistema a partir das ruínas. 

 

Na esquerda, já podemos ouvir apelos pelo velho baú empoeirado da nacionalização. Para os partidos  reformistas da esquerda, o resgate financeiro sueco do começo dos anos 1990 é a opção preferida em vez de um Republican-style Savings e Loan style approach. Para a esquerda “revolucionária”, o alvo será capitalismo estatal desenvolvido com, como prometeu Lênin, a nacionalização estatal “socialista” dos bancos e assim criar nove-décimos de socialismo em uma só cartada. 

 

Embora o keynesianismo social possa ser preferível ao neoliberalismo ou ao “socialismo” leninista, os anarquistas deveriam destacar que estas não são as únicas alternativas. Precisamos deixar claro que as alternativas acima são uma maneira maluca de gerir a economia e que não precisamos viver dependentes do investimento de pessoas ricas. Particularmente quando eles não fazem um bom trabalho ("Stop panic in the City -- abolish capitalism!") Precisamos trazer à tona a necessidade pelo anarquismo, substituir capitalistas por burocratas estatais não é nenhuma real mudança. 

 

O grande desconhecido destes tempos é o povo, a classe trabalhadora. Se permanecermos quietos qualquer socorro financeiro atenderá apenas os interesses do grande negócio, nada mais. Se permanecermos quietos então os custos da recuperação serão lançados sobre nossos ombros na forma de desemprego crescente, na forma de salários mais baixos, de impostos mais altos. Se nós permanecermos quietos o neoliberalismo continuará devastando tudo crise após crise, privatizando  lucros enquanto socializa perdas e custos. 

 

Nossa tarefa enquanto anarquistas é elevar nossas vozes e encorajar a ação direta. As tentativas de cortar salários devem ser barradas. Não fomos nós que criamos esta crise e não seremos nós que vamos pagar pelo pior (“cortes de salários reduziriam desemprego?”). A tentativa de fechar locais de trabalho deve ser obstada através da ocupação. Qualquer tentativa de despejar famílias de suas casas deve ser impedida. Precisamos socializar os meios de vida, e não entregá-los a alguns capitalistas ou burocratas de estado. Precisamos organizar a comunidade e realizar assembléias no local de trabalho para construir uma alternativa a esse sistema em crise, uma alternativa baseada na solidariedade e na liberdade.



Traduzido de http://anarchism.pageabode.com/anarcho/capitalism-in-crisis-again

Nenhum comentário: